2018 foi o ano que marcou o início da ascensão do autoconsumo, tanto industrial como residencial, com a revogação do chamado “imposto solar”, concretamente do Artigo 17.º. Encargos associados aos custos do sistema elétrico do Real Decreto 900/2015, de 9 de outubro, que regula as condições administrativas, técnicas e económicas das modalidades de fornecimento de energia elétrica com autoconsumo e de produção com autoconsumo. Esta aplicação de encargos não representava uma grande penalização para o investimento, mas tornou-se num imposto dissuasivo. Por sua vez, a eliminação do imposto provocou um efeito de atração moderado. Ao mesmo tempo, o Acordo de Paris entra em vigor em 2016, e a apresentação do Pacto Ecológico Europeu em 2019 motiva o setor industrial a investir na descarbonização.
Dado que na ARRAM estamos muito próximos do cliente industrial, compreendemos que os seus receios estão fundamentados em vários aspetos:
1. O desconhecimento deste tipo de instalações: tendo em conta que cada indústria está focada no seu produto, com uma dedicação total ao que é “seu”, quando recebem a visita de um grande número de vendedores a oferecer-lhes coisas tão “estranhas” como leasing financeiro, PPAs, painéis poli-mono-bi..., e cada um com procedimentos diferentes, cria-se um efeito de rejeição por parte de quem recebe esta informação, que normalmente é o responsável de produção da fábrica.
2. O receio quanto à localização nos telhados, que, apesar das garantias oferecidas pela empresa instaladora, era difícil de convencer.
3. A perceção de que o vizinho “ainda não o fez”. Após a fase de “desconexão” mental do industrial perante o vendedor que fala de coisas que ele não entende, e quando diz que resolve o problema do telhado com um seguro “infinito”, fica o argumento difícil de combater de que “em todo o parque industrial onde estou, não há nenhuma instalação...”
É importante compreender que no setor industrial, decisões desta magnitude não são tomadas em poucas semanas. Envolvem meses de reuniões interdepartamentais até que a decisão seja tomada. E embora a motivação de ter um preço de energia assegurado para 25 anos com geração renovável seja uma grande motivação (especialmente, como explicarei mais adiante, quando os preços da energia são altos), acredito que a maior motivação veio de uma decisão estratégica do Presidente ou do CEO, que é o compromisso de oferecer ao mercado um produto sustentável, de acordo com os novos tempos em que o cliente começa a valorizar essa contribuição.
Por isso, 2018-2019 foram os anos em que se “cozinhou” o investimento em centrais de autoconsumo fotovoltaico no setor industrial. 2019-2020 podem ser os anos da fase de licenciamento e estudos prévios à obtenção das autorizações. Tudo pronto para que em 2020-2021 a instalação se tornasse realidade.
Além disso, em junho de 2021 foram publicadas as ajudas ao autoconsumo, com percentagens de até 50% do investimento. Sempre pensei que essas ajudas não eram necessárias, que o chamado efeito incentivador já existia por si só no mercado, e que as decisões, pelo menos no setor industrial, não eram baseadas num subsídio.
O cenário é muito promissor: passamos de 49 MW instalados em 2016, em 2019 são instalados 388 MW, em 2020 mais 530 MW, e em 2021 898 MW, o que nos coloca em 2.159 MW de autoconsumo industrial instalados no total. Um aumento que atrai muitas empresas promotoras, instaladoras e de serviços que não existiam anos atrás.
Em 2020, a pandemia de Covid-19 alterou o panorama mundial, reduziu a procura energética, e 2021 ressentiu-se no preço da energia. A média do OMIE passou de 33,96 €/MWh em 2020 para 112,93 €/MWh em 2021. E no início de 2022, a guerra na Ucrânia provocou uma crise energética que complicou ainda mais os preços da energia, com uma média de 167,52 €/MWh e picos de até 700 €/MWh.
Isso torna o autoconsumo uma necessidade para proteger-se das incertezas do mercado energético. A potência instalada em 2021, que era de 898 MW, praticamente duplicou para 1.625 MW em 2022.
Finalmente, 2023 é o primeiro ano desde 2016 em que se observa uma desaceleração da potência instalada em relação ao ano anterior. A inflação e a subida das taxas de juro fazem com que muitas instalações, até mesmo as planeadas, sejam congeladas para usar os recursos noutras iniciativas. E os dados de 2024 também refletirão uma queda na potência instalada em comparação a 2023. Esta tendência reflete a estabilização de um setor que cresceu muito rapidamente e entra numa fase de maturidade, em que as empresas que prestam serviços passam de “despachar” clientes para procurar clientes, de enviar ofertas “padrão” para fazer ofertas personalizadas, de contratar uma solução chave na mão para trabalhar com uma engenharia interna, de executar com uma engenharia básica para concretizar com uma engenharia detalhada.
O autoconsumo industrial continua a ser uma opção atrativa por várias razões:
-1. Redução de Custos Energéticos: A possibilidade de gerar a sua própria energia permite às empresas reduzir significativamente os seus custos operacionais.
-2. Sustentabilidade Ambiental: O autoconsumo contribui para a redução das emissões de gases de efeito estufa, ajudando as empresas a cumprir os seus objetivos de sustentabilidade. A adoção de energias renováveis também melhora a reputação corporativa.
-3. Independência Energética: As empresas que optam pelo autoconsumo reduzem a sua dependência do mercado energético, o que lhes proporciona maior estabilidade e controlo sobre os seus custos operacionais.
-4. Inovações Tecnológicas: O avanço em tecnologias, como os sistemas de armazenamento de energia, está a melhorar a eficiência e a fiabilidade do autoconsumo.
Como exemplo, um gráfico onde encontramos uma correlação quase perfeita entre a evolução do preço da energia com a potência instalada e com a taxa de crescimento anual. Fonte: elaboração própria.